O amor divino, manifestado em Jesus, é colocado no Evangelho (Jo 15,9-17) como identidade dos discípulos de Cristo: “Nisso conhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo 13,35).
O amor cristão se fundamenta no modelo do amor de Cristo: “Que vos ameis uns aos outros como eu vos amei”. A autodoação de Jesus se torna o modelo para os relacionamentos humanos. Aqui não se trata de um ideal filantrópico, mas trinitário. O mandamento de Jesus é novo porque revela o relacionamento de amor entre o Pai e Jesus. É o dom do Filho que fundamenta e dá qualidade e novidade ao amor recíproco entre os cristãos.
E Jesus nos diz: “Permanecei no meu amor” (Jo 15,9). Permanecer no amor de Deus traz uma consequência prática: a observância dos Mandamentos. Aquele que deve permanecer na corrente do amor divino é o ser humano todo: não apenas a mente, mas também a vontade, decidida a aceitar a Vontade divina. De fato, não pode haver amor autêntico e sincero se não houver uma adesão plena da vontade de um ao outro: é somente a partir da fusão das duas vontades que o amor surge. Portanto, amar a Deus e não observar seus Mandamentos é uma verdadeira contradição. Jesus diz isso muito claramente: “Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor” (Jo 15,10).
Quem busca Deus está sempre disposto a observar seus mandamentos. Deus, que é amor, como nos lembra São João na segunda leitura, deseja o que é bom para cada um de nós. Seus preceitos são, portanto, o melhor caminho, na verdade o único, para que alcancemos o nosso verdadeiro bem definitivo e eterno. Jesus demonstrou seu amor ao Pai observando os Mandamentos do seu Pai e o fez com obediência assídua e perfeita. Assim, Ele nos convida a fazer o mesmo, mostrando-nos seu exemplo. O seguimento de Cristo é, de fato, o grande caminho que o cristão é chamado a percorrer e é a fonte da maior alegria. Jesus confirma isso: “Eu vos disse isto para que participeis da minha alegria e vossa alegria seja plena”.
Em seguida, Jesus estende sua exortação ao amor pelo próximo. Ele se coloca como modelo do verdadeiro amor: “Como eu vos amei”. O modelo a ser imitado é sempre de natureza divina: é Cristo mesmo, aquele que sabe e pode verdadeiramente amar no sentido mais pleno da palavra. Como eu vos amei: e aqui devemos pensar em nossa Criação, na Redenção, no Sacrifício de Cristo por nós, em todos os dons dos quais ele nos torna participantes.
O amor de Cristo coloca em crise o poder como prerrogativa dos relacionamentos humanos. O poder que instrumentaliza o ser humano é um dispositivo que divide e humilha. Com sua morte, Jesus elimina essa concepção de amor. Podemos constatar isso quando Jesus lava os pés dos discípulos e pede que eles façam o mesmo. A mensagem de Jesus no ato de lavar os pés é profunda: não há outra verdade para o cristão se não morrer para que outros tenham vida. É dom da vida que dá origem a um outro tipo de relacionamento. Jesus, doando a sua vida, se coloca como fundamento e modelo das relações que não baseadas no poder e na divisão de classes, mas no dom de si.
“Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos amigos” (Jo 15,13). O amor deve ser desinteressado ao máximo para merecer ser chamado de amor cristão. E nós, criados à imagem e semelhança de Deus, somos chamados antes de tudo a amar, somos chamados a refletir o amor de nosso Criador no amor fraterno. Quanto mais amamos, mais conseguiremos conhecer a Deus e fazê-lo conhecer àqueles que nos rodeiam.
Dom João Carlos Seneme, css Bispo de Toledo |