Estamos no final do Ano Litúrgico, por isso os evangelhos dos últimos domingos trataram sobre o tema da vigilância. Também neste domingo, somos convidados a refletir sobre a dimensão fundamental de nossa existência: a esperança que nos aguarda. Não se trata de um futuro desconhecido e indefinido, trata-se de uma pessoa viva: Jesus Cristo Ressuscitado. Ele é o nosso futuro, Ele é nossa esperança, Ele é o cristão dos últimos tempos. É o que proclamamos na celebração eucarística: “Anunciamos, Senhor, a vossa morte e proclamamos a vossa ressurreição. Vinde, Senhor Jesus”!
A Parábola dos Talentos (Mt 25,14-30) é uma meditação sobre a conduta do cristão enquanto espera seu Senhor, que retornará “depois de muito tempo”. A distância do seu retorno não deve iludir ou enganar: o Senhor nos questionará sobre como o esperamos.
Em sua relação com Deus o ser humano não pode reivindicar direitos; deve ter consciência de sua absoluta dependência, como um servo diante do senhor e, como servo, deve ouvir atento as ordens de seu Senhor e cumpri-las. Para tanto deve se esforçar com muito ardor para executar o que o Senhor determinou com a consolante e estimulante esperança de que o Senhor valoriza o esforço pessoal realizado para fazer frutificar o que lhe foi confiado.
A divisão desigual que o homem rico faz de seus talentos entre seus servos tem o objetivo de fazer frutificar o seu capital nas mãos dos seus servos. Por isto ele considera a capacidade de trabalho e habilidade dos seus servos em administrar sua fortuna. Os dois primeiros servos duplicam os talentos iniciais que lhes foram confiados.
A recompensa descrita na parábola faz uma clara referência à realidade religiosa. “Vem participar da minha alegria” é o prêmio concedido aos dois servos pela sua fidelidade ao entregar ao senhor a fortuna duplicada. Trata-se evidentemente da vida eterna. Quem fala é o Filho do homem em sua qualidade de juiz. Como se trata de uma realidade sobrenatural, os talentos duplicados são considerados “poucos”: “como foste fiel na administração de tão pouco…”.
O terceiro servo não faz o capital crescer e ainda raciocina e se justifica de modo insolente para se desculpar. Não quis arriscar. O talento não frutificou em suas mãos; ele o restitui inteiramente. O senhor lhe responde duramente porque havia colocado esperanças no servo. O senhor tinha consciência do risco, porém contava com o zelo e empenho do servo. A passividade e o medo do servo fazem com que o talento que lhe foi confiado não frutifique.
Não há diferença entre quem recebe mais e quem recebe menos. Cada um recebe de acordo com sua capacidade. O que importa é que o dom seja colocado a serviço do Reino e que faça crescer os bens do Reino que são o amor, a fraternidade e a partilha. A mensagem central da parábola não consiste em fazer frutificar os talentos, mas indica a forma como devemos viver a nossa relação com Deus: os dois primeiros colaboradores não pedem nada, não procuram o próprio bem-estar, não olham os talentos por si mesmos, eles não calculam, não medem. Com a maior naturalidade, quase sem perceber e sem procurar crédito para si, começam a trabalhar para que o dom recebido dê frutos para Deus e para o Reino. O terceiro empregado fica com medo e, por isso, não faz nada. De acordo com as normas da lei antiga, ele age corretamente. Mantém os requisitos estabelecidos. Ele não perde nada, mas também não ganha nada. Por isso ele perde até o que tinha. O Reino é risco. Quem não quiser arriscar perde o Reino.
Dom João Carlos Seneme, css Bispo de Toledo |