Grande parte das pessoas ainda não se deram conta de que o mundo está de cabeça para baixo, virado. Um simples exemplo comprova esta ideia. Em nosso meio sempre ouvimos as pessoas falarem que “só é pobre quem não quer trabalhar”. Logo, só não sobe na vida quem é vadio. Na prática, a situação é bem diferente. E muitas pessoas estão percebendo o contrário: quem é esperto e vive dos frutos do trabalho dos outros é que sobe na vida. É evidente que há exceções: pessoas que estão bem e trabalham honestamente.
Por que as pessoas enxergam, mas não vêem? Por que existe tanto “lambari com cabeça de tubarão” ou tanto “pobre com cabeça de rico”? O texto de Isaías 44.9-22 pode nos ajudar a responder a estas perguntas. Uma pessoa, diz o texto, vai ao mato e corta uma árvore. Ele havia plantado esta árvore que a chuva fez crescer. De uma parte da árvore ela faz lenha para cozinhar seus alimentos e para se aquecer. Do que resta, ela faz um deus, diante do qual se ajoelha, e lhe dirige uma oração, dizendo: “Livra-me, porque tu és o meu deus.” Assim nasce a idolatria.
O que aconteceu com a cabeça desta pessoa? Parece que de um momento para o outro esqueceu de que ela havia criado um deus. O texto conclui dizendo que o seu coração enganado a iludiu de tal forma que não consegue se livrar dos produtos de suas próprias mãos. Aquilo que não se tomou necessário para a satisfação das necessidades básicas transformou-se num ídolo opressor.
Aos discípulos que estavam a caminho para Emaús (Lucas 24.13-35) se junta um desconhecido. Seus olhos que estavam fixos nos acontecimentos da sexta-feira – morte de Jesus – impediam-nos de reconhecer no desconhecido o próprio Jesus. Durante o caminhar, Jesus discorreu sobre as Escrituras, mas os olhos dos discípulos estavam vendados pela frustração e desesperança. Só quando Jesus partiu o pão, eles perceberam que Jesus havia ressuscitado.
A partilha do pão e daquilo que se produz, além das necessidades básicas, abrirá os nossos olhos. Como alguém já falou, Jesus nunca fez a cabeça de ninguém, mas os pés. O serviço solidário junto aos que estão à margem, aos desiludidos e aos desesperançados abrirá a cabeça, e as máscaras cairão por terra. Só o amor radical, que vem de Deus em Cristo, fará com que o mundo seja transparente. Com uma leitura crítica da nossa sociedade podemos concluir que estamos vivendo em um mundo totalmente desorganizado e com vários problemas socioeconômicos e cultuais. É urgente a mudança de mentalidade de todos os homens e mulheres para que possamos construir uma sociedade mais humana e justa.
* Filósofo e teólogo, professor de filosofia, antropologia e história, professor da Rede Estadual de educação.
pardinhorama@gmail.com